DESFLORANDO
Regina Coeli
Minha boca, vermelha qual cereja,
Despertava-te anseios de rapaz
Num querer sempre, sempre, e sempre mais
Muito mais do que o mais que se deseja.
Minha boca, serena, a um beijo almeja
Ainda hoje, que amar me satisfaz,
Mas fui barco atracando num jamais
E aquilo que não foi, talvez não seja.
Ao te beijar, beijavas outro alguém,
Só no meu sonho eu era tua rainha;
Somente em sonho eras o meu bem.
Desflorei-me no tempo, tão sozinha,
E desfolhei tua boca, que também
No meu sonho, sonhei, foi sempre minha!
FRAGRÂNCIA
Regina Coeli
Amei-te no perfume delicioso
Brotado dos teus versos bem faceiros
Cheirando ao doce tom dos jasmineiros
Floridos num passado esplendoroso.
Nas rimas evolavas um dengoso
Aroma, e em teus balanços seresteiros
Embalavas-me os sonhos nos canteiros
Do teu poema lindo e tão amoroso.
Aos poucos teu silêncio foi chegando
E a rima, que cantava e me sorria,
Não tinha mais olor me inebriando.
Acaso me perdi da fantasia
Ou, aberto o teu frasco a um novo quando,
Deixaste evaporar a poesia?
DE ONDE VÊM AS CANÇÕES?
Regina Coeli
Canções, com cor e beleza,
são notas vivas pelo ar,
são sons que a Mãe-Natureza
dá aos filhos pra cantar.
Canções são rasgos de Amor
dispersos pelo Infinito,
são pétalas de uma flor
formando um todo bendito.
Canções... de onde vêm, quem são?
Canções vêm de ti, de mim,
lampejos do coração
cheirando a rosa ou jasmim.
Pelo espaço as notas dançam,
dão-se a quem as quer tomar
nas intenções que as alcançam
de linda canção cantar.
São linhas para um bordado,
lindos tons e sobretons,
delírio doce e encantado
que sai das notas e sons.
Canção é algo divino
em boca de flor e mar,
do passarinho é o seu hino
presente no seu gorjear.
Canção do grilo e da rã,
do sapo e do aflito vento,
canção em cada manhã
de tom vivo ou sonolento.
E a mão, que faz da ternura
a partitura do Amor,
chora a humana desventura
em canção cheia de dor...